Saúde mental é mais do que não ter diagnóstico

imagem de uma cabeça com vários adesivos com textos sobre problemas de saúde

Bruno Marinho de Sousa

É possível estar “sem doença” e, ainda assim, não estar bem?

Muita gente acha que por não ter depressão ou ansiedade então está tudo bem, sem problema de saúde mental. Mas será que é bem assim?

A verdade é que passamos boa parte da vida cuidando de prazos dos outros, obrigações nossas, filhos, trabalho e gastamos muito tempo em redes sociais. E a nossa Saúde Mental fica pra depois…

Como escrevi em 2019, a gente só procura ajuda quando os sintomas nos esgotam — e, no caso da saúde mental, muita gente nem sabe do que ela se trata.

Leia mais: O que é Saúde Mental?

Na graduação, por exemplo, pouco se falava de prevenção e promoção de bem-estar, qualidade de vida, como ter uma vida boa. O foco sempre foi eliminar doenças. Tive disciplinas de Psicopatologia I e II, mas nada de como promover Saúde Mental, nem quando fiz doutorado e fui professor. No máximo, tratava-se de transtornos mentais. Mas será que saúde mental é apenas “não ter transtorno”?

imagem com duas cabeças, uma vermelha com alguém dentro em sofrimento, outra verdade, com alguém dentro feliz

O que a Organização Mundial da Saúde diz?

A Organização Mundial da Saúde (OMS) propôs uma definição ampla: saúde é um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não apenas a ausência de doença. Mentalmente, isso significa conseguir lidar com as tensões da vida, trabalhar de forma produtiva, sentir que você realiza seu potencial e contribuir com a comunidade.

Essa definição já é ótima por não se falar de falta de doença. Mas ainda é limitada. E quem está passando por uma fase de estresse ou luto? Ou adolescentes tímidos em fase de desenvolvimento?

Um grupo de psiquiatras propôs uma visão mais dinâmica: saúde mental seria um equilíbrio interno que permite usar habilidades cognitivas e sociais, reconhecer e modular as próprias emoções, empatia, flexibilidade e capacidade de lidar com adversidades, além de uma relação harmoniosa corpo‑mente. Essa visão acolhe o fato de que sentir-se mal de vez em quando faz parte da vida.

Onde entra a doença mental?

A Terapia de Aceitação e Compromisso (ACT) traz uma lógica diferente sobre adoecimento e Saúde Mental.

Ela foca menos em “doença” e mais em padrões de comportamento e de pensamento que causam sofrimento, que impedem a pessoa de viver de acordo com seus valores pessoais.

Em vez de rotular emoções desagradáveis como “sintomas”, olhamos se a pessoa está presa em ciclos de evitação emocional e rigidez cognitiva (ver as coisas sempre do mesmo jeito, gerando algum nível de sofrimento). E isso vai causar uma mudança fantástica no entendimento do sofrimento humano.

Um texto recente do blog Calm explica que, num mundo em constante mudança, adaptar-se às dificuldades é um dos fatores mais importantes para o bem-estar. Quando ficamos presos em padrões rígidos de pensamento ou em emoções negativas, o risco de estresse, ansiedade e depressão aumenta.

A “doença mental”, nesse sentido, surge quando nós perdemos a flexibilidade e nos tornamos reféns de evitar sentimentos desagradáveis e presos na rigidez cognitiva.

O que é flexibilidade psicológica?

De acordo com a ACT, flexibilidade psicológica é a habilidade de se adaptar às situações, aceitar emoções (agradáveis ou não) e, ainda assim, agir de acordo com seus valores pessoais. Isso não significa se resignar, mas abrir espaço para as experiências internas sem que elas comandem nossa vida. Ao contrário, a rigidez nos deixa presos e faz o sofrimento aumentar.

Quando temos flexibilidade cognitiva conseguimos estar abertos a todos os pensamentos e sentimentos e, mesmo assim, escolher ações alinhadas com metas e valores pessoais. Quando a ansiedade ou tristeza aparece, em vez de fugir delas, você as nota, respira, aceita esse sentimento e continua na direção que considera importante. Essa habilidade é central na ACT porque tentar controlar ou evitar o desconforto tende a piorá-lo.

A boa notícia é que a flexibilidade psicológica pode ser treinada. Estudos mostram que ela ajuda a lidar melhor com o estresse, com a incerteza e a se recuperar de problemas da vida. Em outras palavras, ao cultivar flexibilidade, fortalece nossa saúde mental porque não nos deixa refém do modo disfuncional de pensar e sentir.

Fonte da imagem: Critical Path

Então, como podemos cuidar da saúde mental?

De maneira bem simplificada, aqui para o texto, alguns pontos da ACT que você pode usar para entender melhor uma nova visão de Saúde Mental:

  • Aceite as emoções como parte do processo de vida. Sofrer por uma perda ou sentir raiva em um conflito é natural. Está tudo bem sentir isso, pode ser problema o que você faz com as emoções . Reconhecer essas emoções sem julgá-las é sinal de saúde, não de fraqueza.
  • Busque equilíbrio, não a perfeição. Saúde mental é um estado dinâmico de equilíbrio entre corpo e mente. Isso inclui cuidar do sono, alimentação e exercício físico, assim como das relações e do propósito de vida. Oscilar seu humor, ter problemas, é parte, o importante é buscar o equilíbrio.
  • Trabalhe a flexibilidade cognitiva. Desenvolver a capacidade de aceitar pensamentos e emoções e, ainda assim, agir conforme seus valores reduz o impacto de estresse e ansiedade. Uma forma de ter mais flexibilidade é pela leitura!
  • Estabeleça conexões e valores. A empatia e a capacidade de se adaptar são componentes essenciais de saúde mental. Manter relações saudáveis e que te fazem bem é parte do equilíbrio.
  • Procure ajuda profissional quando necessário. Se sentir que está preso em ciclos de sofrimento ou evitação, a Psicoterapia pode ajudar. Na ACT, por exemplo, o foco é aumentar a flexibilidade e engajar em ações significativas.

Resumindo

Saúde mental não é a ausência de doença, de diagnóstico, é um processo contínuo de equilíbrio interno que permite viver conforme o que importa para você. Quando ficamos presos em ciclos de sofrimento, com evitação e rigidez cognitiva, vem o sofrimento. Uma das formas de lidar com isso é buscar o equilíbrio na vida, entre seus valores pessoais e a flexibilidade cognitiva, para irmos em busca do que é importante para nós e nossos valores pessoais.


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