Bruno Marinho de Sousa
Tristeza faz parte da vida ou é sinal de depressão?
Quem nunca chorou de tristeza após uma perda de alguém, uma decepção ou até mesmo diante de um filme emocionante?
A tristeza é uma emoção humana básica, universal e adaptativa. Ela nos ajuda a processar experiências de perda e a reorganizar prioridades para nossa vida. Por isso, muitas vezes confundimos esse estado passageiro com a depressão.
Mas aqui está a questão: quando a tristeza normal deixa de ser um estado saudável e se transforma em algo mais grave, que exige tratamento profissional?
Afinal, tristeza e depressão são a mesma coisa?
Não. Embora estejam relacionadas, são experiências e estados distintos.
- A tristeza é uma reação emocional transitória diante de situações adversas. Tem início, meio e fim; tende a diminuir com o tempo ou com mudanças nas circunstâncias.
- A depressão, por outro lado, é um transtorno mental com alterações duradouras no humor, na cognição e até mesmo no funcionamento cerebral.

Na saúde mental temos um livro de referência que se chama Manual Diagnóstico e Estatístico das Doenças Mentais, que atualmente está na sua 5ª versão (DSM-5). Ele define o Transtorno Depressivo Maior (a “depressão”) como um conjunto de sintomas persistentes por pelomenos duas semanas, incluindo:
- humor deprimido quase todos os dias,
- perda de interesse ou prazer,
- fadiga,
- alterações no sono e no apetite,
- dificuldade de concentração,
- sentimentos de inutilidade e, em casos graves, pensamentos de morte ou suicídio.
Então, acho que agora fica mais claro: diferente da tristeza, a depressão envolve uma desregulação de circuitos neurais ligados à motivação e ao prazer, especialmente no sistema dopaminérgico. Isso explica por que atividades antes prazerosas perdem completamente o sentido para quem está deprimido.
O que a ciência mostra sobre o cérebro na depressão?
Estudos em neurociência apontam diferenças claras entre tristeza passageira e depressão clínica.
- A depressão está associada a alterações funcionais no córtex pré-frontal (menor capacidade de regulação emocional), no hipocampo (relacionado à memória e aprendizado) e na amígdala (hiperatividade diante de estímulos negativos).
- Depressão não é apenas “estar triste demais”, mas envolve um padrão persistente de humor deprimido e anedonia (perda de prazer).
- Pesquisas mostram que a depressão pode reduzir a neurogênese hipocampal e comprometer processos cognitivos, como atenção e tomada de decisão.

Como diferenciar tristeza passageira da depressão clínica?
Um artigo publicado na Psychology Today (2019) lembra que tristeza e depressão diferem em intensidade, duração e impacto:
- A tristeza é limitada no tempo e vinculada a um evento específico.
- A depressão é mais difusa e persistente, sem motivo claro, e pode durar meses.
- Na tristeza, ainda é possível encontrar prazer em alguns aspectos da vida.
- Na depressão, há anedonia generalizada: nada parece fazer sentido ou dar prazer.
Na tabela você pode comparar a diferença entre Tristeza e Depressão.
| Aspecto | Tristeza | Depressão (DSM-5) |
|---|---|---|
| Origem | Reação emocional a um evento específico (luto, frustração, decepção). | Pode surgir sem causa aparente ou ser desproporcional ao evento. |
| Duração | Transitória, tende a diminuir com o tempo. | Persistente: ≥ 2 semanas, podendo durar meses ou anos. |
| Intensidade | Variável, mas não compromete todas as áreas da vida. | Intensa e difusa, interfere no trabalho, estudo e relações sociais. |
| Humor | Humor deprimido, mas flutua conforme o contexto. | Humor deprimido quase todos os dias, sem melhora significativa. |
| Prazer/Interesse | Preservados em outros aspectos da vida. | Anedonia: perda de prazer e interesse generalizada. |
| Função Cognitiva | Atenção e memória preservadas. | Dificuldades cognitivas: concentração, memória e tomada de decisão prejudicadas. |
| Sintomas físicos | Cansaço leve, alterações discretas. | Alterações significativas: apetite, sono, fadiga constante, dores físicas. |
| Impacto cerebral | Ativação emocional normal e adaptativa. | Alterações em hipocampo, amígdala e córtex pré-frontal. |
| Prognóstico | Ajuda na adaptação e reorganização da vida. | Risco de cronicidade, recaídas e pensamentos suicidas. |
Sinais de alerta: pode não ser “apenas tristeza”
Como já citei aqui no texto, vamos apenas recapitular. Esse são sinais que talvez você não está bem e deva procurar ajuda profissional. Todos os sinais devem ser comparados em como você mesma (o) era antes, quando estava bem:
- Humor deprimido quase todos os dias, por mais de duas semanas
- Perda de interesse ou prazer em atividades que antes gostava
- Alterações significativas no apetite ou no peso
- Insônia ou sono excessivo
- Fadiga ou perda de energia quase diária
- Sentimentos de inutilidade ou culpa excessiva
- Dificuldade de pensar, se concentrar ou tomar decisões
- Pensamentos recorrentes de morte ou suicídio
Entenda que esses sinais não devem ser vistos isoladamente, mas pelo seu conjunto e persistência. E, principalmente, devem ser avaliados por um (a) profissional da área da saúde mental.
Então… é possível estar triste sem estar deprimido?
Sim. A tristeza, apesar de dolorosa, pode ser saudável. Ela sinaliza que algo importante aconteceu e que precisamos nos adaptar, refletir sobre o que aconteceu para mudar. Faz parte da vida ficar de luto, sentir frustração, impotência.
Na Depressão o que acontece é um bloqueio desse processo adaptativo. O sofrimento se arrasta, se intensifica e compromete o nosso funcionamento geral. O cérebro, em vez de se reorganizar, permanece em um estado de alerta e desmotivação, retroalimentando os sintomas.
O que fazer diante da dúvida?
Então, respondendo a pergunta do começo do texto: a tristeza deixa de ser normal quando traz um sofrimento, além do esperado, e atrapalha nosso funcionamento em diversas áreas da vida.
Tristeza e depressão não são sinônimos. A primeira é parte da vida e até nos ajuda a crescer. A segunda é um transtorno que exige cuidado clínico. Reconhecer essa diferença é essencial para não banalizar a dor de quem sofre, mas também para não transformar todo episódio de tristeza em diagnóstico psiquiátrico.
Se você se identificou com alguns pontos descritos, lembre-se: buscar ajuda não é sinal de fraqueza, é um ato de cuidado com sua saúde mental. Os principais profissionais que podem te ajudar são Psiquiatras e Psicólogas (os).
Referências:
EYSENCK, M. W. Manual de Psicologia Cognitiva. 7. ed. Porto Alegre: Artmed, 2017.
GAZZANIGA, M. S.; HEATHERTON, T. F.; HALPERN, D. F. Ciência Psicológica: mente, cérebro e comportamento. 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2015.
ATKINSON, R. L.; ATKINSON, R. C.; HILGARD, E. R. Introdução à Psicologia de Hilgard. 15. ed. São Paulo: Cengage Learning, 2010.
NEEL, R. The Difference Between Sadness and Depression. Psychology Today, 2019. Disponível em: https://www.psychologytoday.com/us/blog/happiness-is-state-mind/201910/the-difference-between-sadness-and-depression. Acesso em: 15 ago. 2025.
Akbari H, Sadiq MT, Rehman AU. Classification of normal and depressed EEG signals based on centered correntropy of rhythms in empirical wavelet transform domain. Health Inf Sci Syst. 2021 Feb 6;9(1):9. doi: 10.1007/s13755-021-00139-7. PMID: 33604030; PMCID: PMC7867675.
AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais: DSM-5-TR. 5. ed., texto revisado. Porto Alegre: Artmed, 2023.
